domingo, 11 de setembro de 2011

perspectivas periurbanas

Da perspectiva do meu quarto, ainda é possível ouvir um galo cantar de madrugada, suficientemente cedo para poucos o ouvirem. Aquele galo é a declamação perante um mundo urbano da permanência acesa do mundo rural. Mas até quando?
Da perspectiva da minha janela nocturna, ainda é possível sentir o cheiro do verde a ser inalado por mim, quando vagueio só pelas horas mortas. Esse verde tranquiliza-me e ajuda-me a reflectir. O vento abraça-me e eu sinto a necessidade de chorar diminuir, bem como a tristeza. Esse vento já assistiu a muitos episódios de loucura e desespero e sempre conseguiu mostrar-me quando e como estava errada - e como agir em contrário. Esse vento conseguiu sempre fazer-me ver que as coisas nem sempre são a preto e branco: podem ser verdes.
Da perspectiva da minha janela diurna, ainda é possível ver coelhos a correr por entre as ervas de um solo tão pouco fértil ou, nas horas de maior calor, cabras e bodes a balir e a pastar, atrevendo-se a descer com segurança as inclinações - como se a força da gravidade fosse irrelevante. Estão gordas, penso, e têm um aspecto saudável. O seu pêlo brilha ao sol, que, embora descoberto, está um pouco preguiçoso. Enquanto elas se alimentam, um senhor com ar pacato e tranquilo senta-se nalgo que não consigo perceber se é um banco ou um rochedo - embora me custe acreditar que haja rochedos por ali, pelo que me lembro do que aprendi em geografia: não estamos no Maciço Antigo e as planícies com estas características típicas de solo não costumam ser rochosas. Em breve, e muito provavelmente, aquele senhor com ar pacato terá a coragem de não deixar aqueles animais passearem por aqueles terrenos, para seu consumo próprio. Afinal, para a maioria das pessoas, é algo perfeitamente normal e sem maldade alguma. Para mim, no entanto, é sempre doloroso entrar num talho (principalmente nos momentos em que levam os animais sem pele e já mortos e quase vazios às costas para cortar), assim como imaginar as cabras e os bodes a correr tranquila e alegremente para o pastor - para um fim hipocritamente nada tranquilo ou alegre.
Molhei os lábios amargamente, voltei a olhar para o meu almoço e vi-me obrigada a pensar nalgo nada gastronómico para conseguir comer o pedaço de carne cozida que estava no meu prato.
Das perspectivas do meu coração, ainda é possível ser verde.

36 comentários:

Catarina disse...

adorei.Da perspectiva do meu ser, este texto está apaixonante

Sílvia disse...

Quem me dera conseguir ser verde por dentro. Infelizmente gosto muito de "chicha" lol

Anónimo disse...

Evelyn Spark: :D Obrigada.

S: Eu gostava de ter liberdade para tal. No entanto, ser vegetariano é apenas um dos pormenores de um ser "verde". Contudo, ser vegetariano é uma questão de força psicológica. Eu era fã de carne e agora gosto cada vez menos.

H. Santos disse...

O teu coração nunca deixou de ser verde hihi

Fora brincadeiras clubistas, é claro que se pode ser verde. Mas eu pergunto aos vegetarianos, também eles não matam para comer!!!? Será que uma planta que lutou para brotar no meio de tantas sementes e sobreviveu a todas as estatísticas, não deveria ter uma vida tranquila até ao fim!!?
Sim, por que elas também têm vida, apesar de não terem sistema nervoso e terem sentimentos, elas têm vida.

(ps: Há quem defenda que as plantas têm sentimentos e tocam musica para elas e falam com elas, loucura ou não, é uma pratica com estranhos resultados)

Eu adoro carne e as propriedades que têm na alimentação. Também gosto d'uma boa salada, mas enfim... Não vejo o drama em comer carne. E não me falem em brutalidade animal, porque nem sempre a acontece e cada vês existe mais fiscalização a respeito devido a qualidade dos alimentos e porque sei que nenhum vegetariano iria comer tofu se visse os processos de confecção que tem, nomeadamente a quantidade de coagulantes usado na indústria.

(Ps2: falo do tofu porque é o supra-sumo substituto da carne)

Não fugindo, contudo ao tema deste texto, que não fala só de alimentação, mas sim da pouca existência de verde nas nossas vidas. Também é com extremo pesar que vejo que existe pouco verde entre nós e o verde que temos nas cidades é tão artificial, tão "mexido", tão estético e com tanta limitação a vida...

Hoje estive no centro do País e pela nacional vi grande pradarias , bois, vacas, cavalos, enfim, fauna rural e adorei ver aquela liberdade a vida, ao que nasce e vive livre, no seu espaço.

Compreendi exactamente onde quiseste chegar e, mais uma vez (bolas já são tantas), concordo contigo a 100%.

(ps3: Grande vista, enorme escritora, viajei até a tua janela com essa descrição)

Anónimo disse...

Cota: É precisamente isso que me faz sentir mal faça a comer carne: os sentimentos. As plantas têm vida, mas não têm sentimentos, porque isso é uma propriedade cerebral, coisas que elas não têm.
Eu não condeno quem come carne, porque faz parte da cadeia alimentar, mas cai-me sempre mal quando penso em determinados casos. Custa-me que aquelas cabras, em específico, ganhassem afecto por um pastor que as vai matar. Custa-me, em suma, que tratem bem os animais apenas para proveito próprio.

Maria, Lorena disse...

Belo texto, belas e reais suas observações! Amei!!!

Anónimo disse...

Lorena: Obrigada. :)

Riga/V-1-Boy disse...

aqui ha uns anos tambem era assim, mas fora a parte do galo, o resto ja nao se v~e por aqui, agora existem muitas casas, isto aqui nesse ponto cresceu muito

Anónimo disse...

Riga/V-1-Boy: Eu não acho que eles urbanizem isto ainda mais, até porque isto está cheio de montes e etc.

Sophie disse...

Olá! É engraçado que as perspectivas do teu quarto, janela quer diurna quer nocturna, de certo modo se parecem com as minhas. :) Apesar de não ser tão rural assim mas gostava de viver num local como descreves. Quando escolhi o meu quarto teve de ser virado para uma floresta porque o verde me inspira e apesar de as pessoas estarem a mover-se para a cidade, eu prefiro os subúrbios ou mesmo o meio rural talvez por uma questão de sossego embora a terrinha seja tudo menos sossegada! haha :P Obrigada pelos teus comentários :) Como tu dizes, às vezes o sistema bate assim um bocadinho para o mal e faz posts assim um bocadinho estranhos. :P Mas por acaso não sei mesmo porque queres escrever Morphy quando fizeres uma tatuagem! haha Shame on me!

Anónimo disse...

Hayley Nya*: Só a própria Morphy sabe sem ser preciso que eu lho diga. Já aqui tens uma pista. :p

Sophie disse...

Olá! ^^ Bem, ainda confundiste mais o meu minúsculo cérebro! hahaha enfim... tenho de voltar ao treino inicial com as aulas! haha :P Obrigada pelo teu comentário! haha E eu que pensei que ia sair assim uma coisinha muito simples e de pouco crédito! haha Ainda bem que ficaste embrenhada, agora que reli e com a música apercebi-me que até nem está má de todo! haah :) um beijinho! *

Anónimo disse...

Hayley Nya*: Tu realmente tens o sistema a funcionar mal, para achares que isso está menos do que excelente.

Unknown disse...

Confesso que senti uma ponta de inveja de todo este verde que descreves e que vives. Não tenho isto e mesmo imaginando o quanto pode ser bom, sempre tive algo dentro de mim demasiadamente obscuro e depressivo que me fez afeiçoar-me ao urbanismo.
Quanto a janela do meu quarto, está tão encerrada e como o clima é quase sempre cinzento, se eu ficar dentro de meu quarto dois dias não saberei distinguir quando é dia ou noite. É assim que vivo.
A questão do vegetarianismo, veganismo, eu costumo não discutir. Escrevi um post em meu blogue a respeito de uma contaminação que tive com salmonella, em verdade, duas e até hoje não descobri o verdadeiro culpado do crime. ahah. Mas depois da primeira intoxicação alimentar, comecei a frequentar fóruns veganos e percebi que havia muitas pessoas com idéias radicais e até mesmo doentias.
Nada contra as opções de vida, cada qual com a sua, mas penso que havemos de respeitar o modo de vida de todos e não querer impor uma idéia que nos pertence a outros, podemos comentar, esclarecer, mas impor, nunca.
É isto, escrevi demais para um primeiro comentário em um blogue. :)
Passo a seguir-te, sou parceiro da Hayley em alguns escritos e através do In The Mourning cheguei até aqui.

Anónimo disse...

Christian: Escreveste nada. :) Não me incomoda, isso.
Concordo contigo: podemos influenciar os outros das nossas ideias, mas nunca devemos, sequer tentar!, impô-las.
Benvindo ao Controlo Demente. :)

Sophie disse...

Olá! :D Eu não posso dizer que odeio a escola... acho que não gosto dela pelo simples facto de certas pessoas estarem lá. Eu nunca fui de fazer assim muitas amizades porque no local onde eu vivo é tudo do género: eu é que mando e sei. E pronto, eu não concordo e depois há desavenças. Portanto, tens sorte de viver num meio assim! haha E aquela tótó que me convidou é do género. Eu já lhe disse umas verdades só que o problema é que ela depois vem toda queridinha para ti como se não tivesse passado nada, o que é absolutamente frustrante! haha :P Também te acontece o mesmo? Eu também não me atraio por adolescentes do género Justin Bieber ou Robert Pattinson... sou mais do género Keanu Reeves, Bradley Cooper e muitos outros com idades superiores a 30 anos! É uma festa! hahaa

Riga/V-1-Boy disse...

eu sei que queres ler por ordem as cenas do estamine , mas se quiseres abre uma excepçao e v~e o post de ontem. =P

Anónimo disse...

Hayley Nya*: Eu não me sinto minimamente incapaz de me apaixonar por adolescentes, só não me atraio é por adolescentes com ar mesmo de adolescentes. Para mim um rapaz ou homem só é atraente quando tem um ar mesmo de homem, não de menino. eheh
Para além de que eu só me consigo atrair, mesmo que sexualmente, por homens se estes também tiverem pensamento de homem. Não digo que precisem de ser muito sérios, mas se eu não vejo maturidade ali... chapéu.

Sophie disse...

Olá! Nisso somos iguais... eu cá não gosto de imaturidade... perde toda a piada! haha Obrigada pelos teus comentários, vi os links e gostei até os segui! :D Eu tive experiência de deixar os sonhos para trás e o resultado foi... um pouco catastrófico mas não me referia à escola porque eu serei a eterna "baldas"... projectos pessoais assustam-me muito mais, objectivos para além da escola embora também me preocupe o futuro e, poe estúpido que possa parecer, não tenho notas de topo mas estarei talvez entre as seis melhores mas há coisas que nem sempre correm como corremos nem estão tão boas como pensamos e parece que já nada faz sentido e que tudo está mesmo a desmoronar. Acho que preciso de um período de reflexão por tempo indeterminado... é complicado... :) Obrigada e um beijinho! ^^

Anónimo disse...

Hayley Nya*: É isso mesmo... precisas de um período de introspeção e de reflexão... de um tempo para ti.

Pedro Miguel disse...

Andrew Landon - The Dream

Izza Shocks disse...

Olá boa tarde, visto que tens mais prática e jeito que eu para escrever, eu gostaria de te pedir um favor muito muito grande e importante para mim.
Adoro escrever, porém preciso de dicas construtivas para o meu aperfeiçoamento, por essa razão eu gostaria de contar com a tua presença no meu blog.
Era muito importante para mim ter as tuas criticas. :)

Muito obrigada, http://piiecesofstoriies.blogspot.com/2011/09/odeio-o-cansaco-pela-carencia-que-este.html

Fico à espera,

Izza.

Anónimo disse...

Izza Shocks.: Eu farei o meu melhor, dentro do que for possível. :)
Obrigada eu.

Izza Shocks disse...

Muito obrigada, era mesmo este tipo de dicas que andava à procura.
Percebi exactamente o que quiseste dizer, e vou também tentar pôr em prática.
Espero que continues a seguir o meu blog, pois as tuas criticas são sempre muito bem vindas.
Vou seguir-te :)

Anónimo disse...

Izza Shocks: Obrigada. :) Eu também já o estou a fazer.

Xs disse...

Muito giro!
Adorei!

Anónimo disse...

Su: Obrigada pela visita. :)

Xs: Obrigada. :)

Bárbara disse...

Tens razão, o sarcasmo é a melhor coisa de sempre :p Menos quando não o percebemos haha

Anónimo disse...

Bárbara: Perde a piada, sim. Mas eu não diria que é a melhor das melhores das melhores. :p

Sílvia disse...

http://3.bp.blogspot.com/-mK4TIWvdkKk/Tj7tbz07boI/AAAAAAAACuc/zC-WNWm0Pdk/s400/sk.png

:P

Anónimo disse...

S.: Ahaa! Vês? Por aí se explica por que eu gosto tanto de Harry Potter e tão pouco de Crepúsculo. Falta apenas uma coisa: é que o primeiro também defende o amor como força suprema, enquanto que o outro é mesmo baseado nos hormonas.

Sílvia disse...

Bwahahahah xD
Eu gosto de passar a mão no pêlo a lobos... (desde os tempos do Wolf no videoclip do CMWYS eheh).
Mas pronto, o HP é bem melhor.

Anónimo disse...

S: Eu senti-me inicialmente atraída pela sensação de proibição e do vampirismo, mas rapidamente perdi o interesse, quando me apercebi do conteúdo daquilo.

Anónimo disse...

Começas duma forma tão artistica e depois inseres o tema sobre ser verde, gostei muito, também penso nisso às vezes e apesar de não pensar em ser vegetariana, pessoas que comem carne como animais selvagens metem-me impressão. Mas a mim é mais o peixe porque as vezes vai parar peixe da pesca ilegal aos hiper-mercados, prefiro que os meus pais comprem numa peixaria local.

Anónimo disse...

Victória J. Esseker: Então mas... há maior controlo de origem do peixe nos mercados locais?

Anónimo disse...

Não sei bem como é que funciona mas por exemplo o peixe que os meus pais compram uma vez que outra no domingo é apanhado de manhã pelos pescadores locais e confio mais nisso do que no jumbo