Hoje vi-te.
Sentado, com um acompanhante que nunca foi nem será teu amigo, nem sequer te acompanhará em lado algum aonde queiras ir que aspire a felicidade. E, se pedires que vá contigo destruir-se, tampouco se importará.
Porque é assim que os teus relacionamentos funcionam. Não funcionando, não existindo. E, existindo, têm de terminar. Antes que realmente te afeiçoes à outra pessoa e isso te obrigue a pensar nas consequências dos teus atos - e, sobretudo, no impacto das tuas palavras.
Liberdade, chamas-lhe. Embora saibas, no fundo, que nunca conseguiste enganar ninguém - nem a mim, nem a ti.
Vi-te. Enrolavas mais uma bombinha durante a pausa para o único trabalho digno que alguma vez tiveste. Aquele que eu te arranjei, prolongando o meu próprio desemprego.
É uma boa forma de agradecimento. Pelo menos conseguiste mantê-lo ao longo destes meses. Sem ironia ou veneno, surpreendeste-me pela positiva.
Eu tagarelava sobre as minhas teorias da sexualidade com uma das alianças que reencontrei nesta vida, e que sei que me irá acompanhar nas próximas também. Os amigos não se fazem, reconhecem-se. Lembras-te? Eu reconheci-te, mas não como amigo.
Com certeza ouviste-me e preferiste disfarçar. Afinal, não querias de todo que o teu amigo se apercebesse também. Por algum motivo que, sinceramente, pouco me importa de todo.
Foi bom ver-te. Foi bom não conseguir sentir mais nenhum arrepio, aperto ou calor. Saber que a tua missão na minha vida ficou concluída.
E foi bom ter-te tido. Melhor ainda foi perder-te. Sei hoje que foste uma oportunidade última que tive de me amar a mim própria e de ser suficientemente corajosa para me libertar do que me provocava dor.
No fundo, agradeço-te. E grata estou por te ter visto hoje e confirmado que deixar-te foi a melhor decisão que fiz até hoje. A mais egoísta também. E foi graças a esse egoísmo que pude finalmente dizer: eu sou livre, e viver hoje uma felicidade para a qual eu nunca tinha estado preparada antes. Porque, antes de ti, não saberia disfrutá-la e preservá-la.
E, como sempre, concluí que o universo é perfeito. Afinal, não sabemos quem não somos até nos perdermos.
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quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
quarta-feira, 30 de maio de 2012
Personagens de uma Paixão Platónica
Conteúdo para Adultos
A pele morena que me encanta, os carnudos lábios que me seduzem. As suas mãos nas minhas costas, descendo gentilmente, apertando-me contra o corpo que me consome. As minhas na sua nuca, aceitando, entregando, retribuindo o desejo de querer, de tocar, de fazer. Em volúpia desatenta, mas concentrada - entre dar e receber, num afastamento intencionalmente falso, num aproximar de respirações ofegantes que definem dois corpos suados. A pressão entre desejos, a divergência convergida, convergente, ardente. A força entre um e outro, que do empenho de ambos parte, a não desistência, a resistência, a incomplacência. O amar, o querer, o rasgar, o ter, o prazer!
Lá fora, harpas cantam, pianos suspiram. A brisa morna, soprando das árvores, sussurra aos ouvidos canções de embalar, mais frescas do que os corpos, que vibram, alargando, massajados.
O repousar da fé em mútuo olhos, espiritualmente trocados. O tocar de peles que se conhecem e não se cansam uma da outra. O saltar de um peito que parece nunca se habituar ao explorado, sendo sempre perdurado. O sentir pequenos e ásperos pêlos caraterísticos na ponta dos delicados dedos de seda. A fusão entre braços por abraços. Os passos das aves, irradiantes de calor que descontrai e quebra a tensão muscular. Os frágeis dentes de leão que voam no azul meio: azul de carícia, de mimo, de ternura. O vento que passa e os cabelos que dançam. Os narizes que trocam pequenas e cuidadosas impressões, como tímidos amantes que se entregam por dedicação, cujos rostos aquecem, um colorindo-se, o outro observando-o.
A cabeça que se encaixa no ombro, o braço que segura o tronco e os dedos que se enlaçam. A paz, devota.
sexta-feira, 30 de março de 2012
"Ma vie s'anime dans ton sourire"
O relvado de lã que cobre as minhas costas conforta-me, dissipando as únicas dores que costumo ter, desde que abro a janela ao Sol. Outrora, tinha medo que a ventania entrasse para a casa e esfriasse o quarto. Quarto, diga-se de passagem, já frio. Não receava, portanto, perder o calor, mas sim intensificar o clima que já me agonizava comodamente. Cansei-me, assim, de tentar isolar o ar e correr apenas as persianas e os cortinados, tal como deixei de usar lâmpadas. A luz do Sol, para ser calor, precisa de se infiltrar verdadeiramente -- e não ser simulada ou barrada parcialmente. Não há meio termo para tudo o que é natural e, portanto, espontâneo -- ou, em última análise, verdadeiro.
Na frente dos meus olhos, vejo a luz correr para me alcançar, por entre a renda branca que baila por entre as tonalidades laranja, verde e rosa, quais holofotes que lembram auroras. Estico-lhe a mão e sinto a simplicidade de ser genuíno arrepiar todos os cabelos do meu corpo, provocando em mim uma sensação de prazer, frescura e calma, à medida que a paz interior se entrelaça e avança pela ponta das minhas unhas, até colocar a sua aliança em mim. A minha cabeça pende da borda da cama, sinto o calor massajar-me a nuca e imagino que os caracóis negros desalinhados que decoram a minha cabeça devem estar agora ruivos, de banhos de Sol. Tu sempre gostaste da forma como o meu cabelo se assemelha à juba de um leão. Não é, contudo, a selvajaria que te prende a mim. A aparência tropical limita-se a incendiar estes corpos que não se desgrudam.
A minha mente maga transforma, subtilmente, as ondas dançarinas nos meus olhos em memórias de uma realidade com a qual nunca deixei de sonhar. Pessoa sussurrava que a realidade é apenas o ponto de partida para o sonho, mas foi com a maior racionalidade que o sonho nos fez partir para a realidade.
O meu peito, todo coberto pela tua existência, sente um calor não suado, um calor intenso e amado. No meu ombro, tenho uma cabeça que arfa sobre o meu pescoço e me faz saber que nenhum mal me pode acontecer. Nos teus braços, repousa toda a minha fragilidade, cujo saber se dissipará com o tempo, até à deterioração fatal que nos espera a todos. Um dia, a doce textura da tua pele não será mais sentida com o toque dos meus dedos. Aquele calor que, no entanto, emana de nós, por mais conscientes que sejamos, é a vitória de uma vida. Por mim, sei que poderia deixar de existir daquele momento em diante, porque seria sempre recordada como alguém que alcançou a felicidade maior que pode existir num ser humano...
Até lá, tenho a proximidade de dois corações que batem em uníssono, tenho as cores mais bem pinceladas na minha mente, e tenho as tuas costas musculadas sobre o meu tórax, debaixo das minhas mãos... E, com elas, acaricio quem está do outro lado e sente a mesma ânsia de viver que eu. Essa, sim, é a melhor recompensa que se pode dar a alguém por crer, por querer, por esperar... A textura ondulada e fria dessa tua pele de caramelo, cujo odor é mais suave do que a maciez do algodão como nuvem de plumas.
Nunca deixes que nada quebre aquilo que construímos. É tudo o que te peço em troca.
Na frente dos meus olhos, vejo a luz correr para me alcançar, por entre a renda branca que baila por entre as tonalidades laranja, verde e rosa, quais holofotes que lembram auroras. Estico-lhe a mão e sinto a simplicidade de ser genuíno arrepiar todos os cabelos do meu corpo, provocando em mim uma sensação de prazer, frescura e calma, à medida que a paz interior se entrelaça e avança pela ponta das minhas unhas, até colocar a sua aliança em mim. A minha cabeça pende da borda da cama, sinto o calor massajar-me a nuca e imagino que os caracóis negros desalinhados que decoram a minha cabeça devem estar agora ruivos, de banhos de Sol. Tu sempre gostaste da forma como o meu cabelo se assemelha à juba de um leão. Não é, contudo, a selvajaria que te prende a mim. A aparência tropical limita-se a incendiar estes corpos que não se desgrudam.
A minha mente maga transforma, subtilmente, as ondas dançarinas nos meus olhos em memórias de uma realidade com a qual nunca deixei de sonhar. Pessoa sussurrava que a realidade é apenas o ponto de partida para o sonho, mas foi com a maior racionalidade que o sonho nos fez partir para a realidade.
O meu peito, todo coberto pela tua existência, sente um calor não suado, um calor intenso e amado. No meu ombro, tenho uma cabeça que arfa sobre o meu pescoço e me faz saber que nenhum mal me pode acontecer. Nos teus braços, repousa toda a minha fragilidade, cujo saber se dissipará com o tempo, até à deterioração fatal que nos espera a todos. Um dia, a doce textura da tua pele não será mais sentida com o toque dos meus dedos. Aquele calor que, no entanto, emana de nós, por mais conscientes que sejamos, é a vitória de uma vida. Por mim, sei que poderia deixar de existir daquele momento em diante, porque seria sempre recordada como alguém que alcançou a felicidade maior que pode existir num ser humano...
Até lá, tenho a proximidade de dois corações que batem em uníssono, tenho as cores mais bem pinceladas na minha mente, e tenho as tuas costas musculadas sobre o meu tórax, debaixo das minhas mãos... E, com elas, acaricio quem está do outro lado e sente a mesma ânsia de viver que eu. Essa, sim, é a melhor recompensa que se pode dar a alguém por crer, por querer, por esperar... A textura ondulada e fria dessa tua pele de caramelo, cujo odor é mais suave do que a maciez do algodão como nuvem de plumas.
Nunca deixes que nada quebre aquilo que construímos. É tudo o que te peço em troca.
domingo, 4 de março de 2012
Homme Fatal
Conteúdo para Adultos
Sentada de lado no cadeirão escarlate, via as minhas pernas despidas, apoiadas no braço direito da poltrona, mudarem de cor, conforme o crepitar das labaredas. O amarelo avançava progressivamente em relação à minha direita, debruçando-se por cima de mim para me abraçar a cintura. Não o conseguindo, um vestígio de sombra ficava desde o meu nariz até à biqueira das minhas sabrinas cor de cinza. Na transição entre o sonho e o sucesso, estava aberto no colo da minha saia cinzenta pregada um espesso volume, onde as rivalidades entre lobisomens e vampiros me eram explicadas. O confortante calor, que, naquela noite de fevereiro, era expelido da lareira no meu lado esquerdo, permitia que eu tivesse apenas a camisa branca vestida, donde pendia a minha gravata vermelha e amarela, e as mangas arregaçadas.
Àquela hora, não costumavam estar muitas pessoas na Sala Comum. Atrás de mim, deveriam estar umas quatro ou cinco raparigas histéricas e um pouco invejosas. Pelo menos assim me pareciam, quando costumavam ver o garanhão desprezá-las para me dar a atenção que ninguém supostamente conseguiria despertar nele. Eu ouvia-as comentar as fofocas mais pindéricas que a imprensa poderia vender e as bugigangas mais dispensáveis que poderiam ser comercializadas. Mais adiante, estavam dois rapazes e uma rapariga de volta dos papéis, quiçá a escrever um relatório para a manhã seguinte ou apenas a fazerem o tempo livre render. Digamos, um deles não deveria certamente estar ali pelo segundo motivo, talvez até nem tanto pelo primeiro, mas mais para não se sentir só. Nunca tinha percebido como uma pessoa tão dependente dos outros pudesse ser aceite como uma de nós, embora compreendesse que talvez apenas eu visse algo de errado naquele rapaz. Mais imparcialmente, era a minha tendenciosidade contra a ingenuidade deles. Como tal, e por questões de respeito, eu limitava-me a não lhe dar muita atenção.
Sentia-me preguiçosa em todo aquele meio agradável e estiquei-me para trás. Deixei a cabeça e os braços penderem no sofá e fiquei a ver o teto com carpete escarlate e o chão com candeeiros. O meu corpo foi perdendo força e os meus músculos relaxaram, em verdadeira paz física. Fechei os olhos e lembrei-me do cheiro do negro cabelo dele. Ah, como gostava que me envolvesse com aqueles seus fortes braços e preenchesse com os seus lábios rosados e carnudos o espaço entre os meus! Como gostava desse seu jeitinho mal intencionado e de como colocava o seu braço à volta dos meus ombros e me aquecia as bochechas com beijinhos, apertando-me com força! E como gostava de não precisar que me admitisse nada...
-- Olá, estudiosa -- uma voz masculina e grave me disse em tom alegre e malandro. Abri os olhos e paralisei por momentos, como que ainda a processar a informação. Levantei a cabeça e, para minha surpresa, ali estava ele, debruçado sobre as costas do cadeirão, com um ligeiro sorriso nos lábios e os cabelos que nem cortinados ondulados, caídos.
-- Estás aí há muito tempo?
Abriu o sorriso por completo e, no mesmo ar sedutor, levantou-se do sofá e contornou-o. Parou encostado às minhas pernas, quase a meu lado, e vi o seu corpo abaixar-se e avançar em direção a mim, enquanto senti o sangue correr mais depressa e o peito inchar por causa aquele ar galã que ele tinha. Não me lembro de pensar mais nada, nem de reagir, quando pousou uma mão de cada lado do meu pescoço e avançou a sua cara em direção à minha:
-- Há suficiente para perceber que essa camisa te fica muito bem.
-- Há suficiente para perceber que essa camisa te fica muito bem.
sábado, 11 de fevereiro de 2012
Odor Lisboeta a Putrefação
Estrada abaixo, António calçou as pegadas molhadas do seu preto envernizado. Cada marca deixada era como um meteorito que colidia com o betão, causando ainda mais fendas. A água era a atmosfera que protegia as fendas de serem mais do que algumas fissuras moderadamente profundas.
O cheiro a carvão das barraquinhas ambulantes de castanhas assadas misturava-se com os odores a suor que o aglomerado de trabalhadores e turistas expelia habitualmente, como um odor intrínseco. Poderia ter sido compreendido como um aconchego ou um realce estilístico, mas, na verdade, quando baixava a cabeça e enfiava o queixo no cachecol coloridamente riscado não queria aquecer a cara com o bafo preso pela roupa, nem exibir o cabelo castanho espigado na sua nuca, mas sim esconder os olhos da paisagem de água suja nas pedras da calçada.
Desde que lhe disse que ela precisava de ser menos precipitada e de dar mais espaço a cada coisa, a relação entre ambos nunca mais foi clara. Ela encavalitava tudo aquilo que lhe dizia respeito e desarrumava tudo de propósito. António não podia virar a esquina que lá estava ela, a barafustar com algo. Quando ele lhe perguntava por que era assim, ela ficava ciumenta e mandava-o ir ter com a ex. Esperava, certamente, que ele a mimasse e mostrasse que a ex lhe era inferior.
Ele, porém, sentia a culpa cair-lhe em cima. A ex, pelo menos, não se chateava com tanta facilidade, nem se adornava. Era naturalmente linda. Pobre, mas verdadeiramente simples. Emanava as cores de dentro de si e não atraía a si toda a espécie de gente. Mas António deixou-se levar pelo que os outros diziam e acreditou na adoração que todos os outros faziam à que viria a ser a sua esposa e maior dor de cabeça.
Por isso, baixava a cabeça e acarretava com as birras da amada. Lá fundo, perguntava-se se era mesmo aquilo que queria para passar o resto da sua vida.
Ah, Lisboa, como és complicada!
Ele, porém, sentia a culpa cair-lhe em cima. A ex, pelo menos, não se chateava com tanta facilidade, nem se adornava. Era naturalmente linda. Pobre, mas verdadeiramente simples. Emanava as cores de dentro de si e não atraía a si toda a espécie de gente. Mas António deixou-se levar pelo que os outros diziam e acreditou na adoração que todos os outros faziam à que viria a ser a sua esposa e maior dor de cabeça.
Por isso, baixava a cabeça e acarretava com as birras da amada. Lá fundo, perguntava-se se era mesmo aquilo que queria para passar o resto da sua vida.
Ah, Lisboa, como és complicada!
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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012
Maré Estrategicamente Brava
Conteúdo para Adultos
Cada mulher é um mar de mistérios e atrai a si qualquer marinheiro voluntário. Qualquer vocação marítima encontra em si o próprio conceito atrativo, quase inconsciente. Nenhum marinheiro que goste verdadeiramente do mar consegue passar ao longe, talvez numa ponte qualquer, ver o mar e não sentir qualquer tipo de melancolia agradada. E eu estava precisamente à beira daquele mar que todos os dias me vinha molhando os pés.
Eu sempre fui daquele tipo de homens que gosta de marés bravas. Não é que, na verdade, o mar seja mau, mas, por vezes, quando está rabugento ou aborrecido, decide chamar um pouco mais atenção, na esperança de haver por perto algum marinheiro aventureiro, que se sinta tentado pela provocação das ondas que rebentam mesmo na sua frente, sabendo que não pode ou não deve mostrar-lhe que o consegue domar.
É de uma grande capacidade de resistência controlar estes impulsos de valente marinheiro e não ceder às pretensões de um mar bravo, que grita com uma discrição falsa pelos seus navegadores, sedento de ser motivo do esforço físico. Eu dava-me já por satisfeito só por ter a capacidade de deixar aquela maré insistir em se exibir através de espetáculos de insinuações e, num ou outro desejo mais violento, de frontalidades.
Deveras difícil, para um homem como eu, recusar uma mulher como aquela, tão persistente, mas tão merecedora de submissão. Eu podia nunca me ter interessado em visitar aquela praia, mas aquela mulher, em específico, intrigava-me por se mostrar tão limpa e tão apetecível e, no entanto, recuar tanto a maré. E, após tanto tempo a respeitar o seu espaço e a caminhar a seu lado, ela deixou de ser uma maré brava e vaza, para ser uma maré calma e cheia. Eu, contudo, divertia-me a soprar-lhe os ventos mais fortes, já com os pés calejados de sal de todas as vezes em que ela me refrescou um pouco; porque aquela mulher -- ah! Aquela mulher! Que mulher... -- tentava sempre conter a bravura das suas ondas, que outrora agitava descontente. Eu sabia que ela queria que eu a explorasse e ela sabia certamente que a sua agitação fazia enfatizar a minha atração por mares bravos -- mas ambos sabíamos que a sua praia era demasiado vigiada para que eu pudesse ao menos molhar minhas mãos dentro das suas curvas.
Mas ela aproveitava cada brecha na segurança para me seduzir até si um pouco mais. Naquele vestido de cetim preto, ela havia deixado discretamente as suas ondas brilharem, tapando as extremidades a renda da mesma pecaminosa cor, como se fossem abas que dissessem, através de telepatia, "abertura fácil". As pernas, quais pedaços de bife, moviam-se de um lado para o outro, destapadas e suportadas pela negra madeira brilhante, que alongam os seus pés e a aproximavam ligeiramente mais da minha altura, conferindo-lhe, simultaneamente, uma elegância vulgar. Mas não era todo esse cheiro que mais emoção me provocava, mas sim o calor que todo aquele volume contido naquele cetim preto emanava, com uma força capaz de me fazer achar que quem está quente sou eu.
E eu limitava-me a ficar sentado naquela cadeira, numa posição descontraída, oposta ao olhar malicioso que eu lhe oferecia em troco de todo aquele espetáculo, igualmente inocente. Eu jurava a mim mesmo testar os meus limites e resistir-lhe, até mesmo quando ela inclinou todo o seu volume na minha direção e, com as mãos apoiadas nas minhas coxas já ardentes, me sorriu, de olhos escuros e rasgados e sobrolhos mais escuros ainda e bem delimitados. E eu ali, a um palmo daquela mulher que me poderia encher as mãos e as horas, toda fácil e firme.
Então, ela moveu rapidamente uma sobrancelha apenas, ofereceu-me o seu sorriso, mordeu-o e, antes que eu o pudesse roubar, levantou-se, virou costas e caminhou até à porta por onde me tinha arrastado antes. Parou de balancear o habitual charme e, já agarrada à maçaneta, atirou-me um olhar cortante, sorriu-me maliciosamente e passou subtilmente todo o meu objeto de contemplação pela porta, deixando temporariamente ao alcance dos meus olhos apenas aquele olhar, que me prometia algo mais. Intrigado pelos seus enigmas, vejo, então, a sua mão singela segurar, perigosamente, por uma ponta, um soutien branco, cuja renda eu juraria já ter visto naquela sala.
Assim que a sua mão deixou cair aquele tecido de suporte, mistério e segredo, pareceu perder lentamente o resto das forças e deslizar. Assim que tudo o que restava de si naquela sala era aquele rastro a dois metros dos meus pés, o meu corpo deixou de me obedecer. Instintivamente, as minhas pernas ergueram-me daquela cadeira e eu submeti-me à influência sexual e amorosa que aquela mulher transbordava para mim. Abri a porta e ei-la, a fugir em passo apressado. Enganas-te se pensas que te safas desta, ouvi-me pensar.
Rapidamente, estava já ela completamente cercada pelos meus braços, contra a parede mais próxima, naquele pátio deserto. O calor não emanava agora daquele peito que saltava, mas sim do seu bafo, verdadeiramente nervoso. Confusamente, molhou os lábios secos, mas eu não achei que a sua própria saliva fosse suficiente. Com os meus lábios encaixados nos seus e a minha língua a roçar na sua, eu senti as suas mãos geladas tremerem contra a minha nuca, enquanto que era impossível distinguir qual das duas respirações estava mais acelerada. Ao aquecer as minhas mãos debaixo daquelas aberturas fáceis de renda, eu desejei apenas que ela tivesse consigo outro vestido, porque aquele estava prestes a ser rasgado.
Deveras difícil, para um homem como eu, recusar uma mulher como aquela, tão persistente, mas tão merecedora de submissão. Eu podia nunca me ter interessado em visitar aquela praia, mas aquela mulher, em específico, intrigava-me por se mostrar tão limpa e tão apetecível e, no entanto, recuar tanto a maré. E, após tanto tempo a respeitar o seu espaço e a caminhar a seu lado, ela deixou de ser uma maré brava e vaza, para ser uma maré calma e cheia. Eu, contudo, divertia-me a soprar-lhe os ventos mais fortes, já com os pés calejados de sal de todas as vezes em que ela me refrescou um pouco; porque aquela mulher -- ah! Aquela mulher! Que mulher... -- tentava sempre conter a bravura das suas ondas, que outrora agitava descontente. Eu sabia que ela queria que eu a explorasse e ela sabia certamente que a sua agitação fazia enfatizar a minha atração por mares bravos -- mas ambos sabíamos que a sua praia era demasiado vigiada para que eu pudesse ao menos molhar minhas mãos dentro das suas curvas.
Mas ela aproveitava cada brecha na segurança para me seduzir até si um pouco mais. Naquele vestido de cetim preto, ela havia deixado discretamente as suas ondas brilharem, tapando as extremidades a renda da mesma pecaminosa cor, como se fossem abas que dissessem, através de telepatia, "abertura fácil". As pernas, quais pedaços de bife, moviam-se de um lado para o outro, destapadas e suportadas pela negra madeira brilhante, que alongam os seus pés e a aproximavam ligeiramente mais da minha altura, conferindo-lhe, simultaneamente, uma elegância vulgar. Mas não era todo esse cheiro que mais emoção me provocava, mas sim o calor que todo aquele volume contido naquele cetim preto emanava, com uma força capaz de me fazer achar que quem está quente sou eu.
E eu limitava-me a ficar sentado naquela cadeira, numa posição descontraída, oposta ao olhar malicioso que eu lhe oferecia em troco de todo aquele espetáculo, igualmente inocente. Eu jurava a mim mesmo testar os meus limites e resistir-lhe, até mesmo quando ela inclinou todo o seu volume na minha direção e, com as mãos apoiadas nas minhas coxas já ardentes, me sorriu, de olhos escuros e rasgados e sobrolhos mais escuros ainda e bem delimitados. E eu ali, a um palmo daquela mulher que me poderia encher as mãos e as horas, toda fácil e firme.
Então, ela moveu rapidamente uma sobrancelha apenas, ofereceu-me o seu sorriso, mordeu-o e, antes que eu o pudesse roubar, levantou-se, virou costas e caminhou até à porta por onde me tinha arrastado antes. Parou de balancear o habitual charme e, já agarrada à maçaneta, atirou-me um olhar cortante, sorriu-me maliciosamente e passou subtilmente todo o meu objeto de contemplação pela porta, deixando temporariamente ao alcance dos meus olhos apenas aquele olhar, que me prometia algo mais. Intrigado pelos seus enigmas, vejo, então, a sua mão singela segurar, perigosamente, por uma ponta, um soutien branco, cuja renda eu juraria já ter visto naquela sala.
Assim que a sua mão deixou cair aquele tecido de suporte, mistério e segredo, pareceu perder lentamente o resto das forças e deslizar. Assim que tudo o que restava de si naquela sala era aquele rastro a dois metros dos meus pés, o meu corpo deixou de me obedecer. Instintivamente, as minhas pernas ergueram-me daquela cadeira e eu submeti-me à influência sexual e amorosa que aquela mulher transbordava para mim. Abri a porta e ei-la, a fugir em passo apressado. Enganas-te se pensas que te safas desta, ouvi-me pensar.
Rapidamente, estava já ela completamente cercada pelos meus braços, contra a parede mais próxima, naquele pátio deserto. O calor não emanava agora daquele peito que saltava, mas sim do seu bafo, verdadeiramente nervoso. Confusamente, molhou os lábios secos, mas eu não achei que a sua própria saliva fosse suficiente. Com os meus lábios encaixados nos seus e a minha língua a roçar na sua, eu senti as suas mãos geladas tremerem contra a minha nuca, enquanto que era impossível distinguir qual das duas respirações estava mais acelerada. Ao aquecer as minhas mãos debaixo daquelas aberturas fáceis de renda, eu desejei apenas que ela tivesse consigo outro vestido, porque aquele estava prestes a ser rasgado.
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sexta-feira, 30 de dezembro de 2011
plumas brancas
O profundo descanso escuro em que me encontrava foi substituído por um vagão de luz branca azulada que se espalhava sobre o leito revolto em que dormia. Preguiçosamente, vi as minhas pestanas desvanecerem do meu campo de visão, permitindo-me encarar o despertar de um novo dia.
À minha frente, vi-te, caído, calmo e vulnerável. Os carnudos lábios onde eu me costumava deleitar estavam dormentes, vagamente separados, sem vida. A tua mão esquerda estava meio fechada, queda, contra o lençol branco em que te confortavas. A direita repousava mesmo ao lado da minha anca, como projeto inacabado de meu alcance.
Fiz a distância entre nós encurtar, a fim de me certificar que não sonhava, para te ter mais real, mais verdadeiro -- mais meu. Nunca o foste, porque a posse é uma ilusão. No final -- porque há sempre um final --, tudo se perde, duma forma ou doutra. Não há nenhum normativo legal que possa substituir as considerações morais -- e nenhuma ética capaz de sustentar a verdade de uma posse. Imediatamente, ouvi, ao longe, João Pedro Pais com o seu clássico ninguém é de ninguém, mesmo quando se ama alguém. Mas há algo que detemos garantidamente e que nem sempre perdemos: o amor. Os sentimentos que nutrimos são sempre nossos, uma vez que nós somos de nós mesmos, e o amor que temos é sempre nossa posse. A pessoa que amamos já não. E eu sempre tive essa noção contigo. Sempre soube que a cor de caramelo torrado que me seduzia pacificamente não era minha. Nunca foste meu, mas eu sempre te amei. Assim como eu também nunca fui tua, mas sempre me senti por ti amada. Isso sempre foi do consenso de ambos, o que permitiu que nunca houvesse crises de ciúmes entre nós, nem discussões acerca da obrigatoriedade ou legalidade da nossa relação, durante todos aqueles anos que tinham passado por nós, a correr. O amor é, sempre foi e sempre será livre. Só assim, livre e espontâneo, nos pode enraizar verdadeiramente a alguém e disponibilizar-nos a capacidade de voar, mesmo com a força gravítica que a física nos impõe.
Prendi o cabelo com o pauzinho chinês que me havias oferecido, há anos atrás. Silenciosamente, limitei-me a observar as graduações de castanho que a eumelanina da tua pele formava, com a luz que te embatia nas costas. Suavemente, senti o calor da tua respiração arrepiar os pêlos meu braço, subir, qual serpente, por mim acima, até à minha nuca. Com a mesma subtileza com que existias, desejei sentir a textura da beleza que me encantava. Percorri, com a ponta dos dedos da mão esquerda, a linha que vinha desde a tua cintura destapada. Passei pelo teu ombro e senti o teu pescoço quente, mas tu continuavas, que nem um anjo, profundamente adormecido. Ao tocar o teu rosto, senti a aspereza dos pequenos pêlos da tua barba e deixei-me fazer cócegas nos dedos. Tal como uma escovinha com pequenas agulhas, aquelas farpas pontiagudas massajavam-me e tranquilizavam-me.
No transe em que estava, não senti que acordavas. Vi os teus grandes olhos fitarem-me, com a surpresa de uma criança. Sorri, embaraçada.
- Bom dia, amor - proferi timidamente, como se essas três pequenas palavrinhas pudessem substituir uma justificação para estar a contemplar-te, qual pecado que ninguém comete.
De imediato, vi um terno e sincero sorriso esboçar-se nos teus lábios e não pude deixar de reparar que os teus dentes estavam tão brilhantes como se nunca tivessem sido usados. Acordaste os teus braços dormentes e as tuas mãos cercaram-me, puxando-me para ti. Ao encaixar a minha cabeça no teu pescoço, passei o meu braço por cima de ti e senti os teus braços a aconchegarem-me as costas, enquanto a tua mão esquerda me acariciava a cabeça e fazias os teus dedos entrelaçarem-se no meu negro e farto cabelo.
Desprendi a minha cabeça de ti, enquanto respirava profundamente, como quem vem à superfície, após um calmo mergulho. Não consegui impedir-me de sorrir enquanto descobria o meu rosto, até ora imerso em ti. Senti um calor enorme invadir-me as bochechas e desviei o olhar, para baixo. O teu braço direito deixou de segurar as minhas costas e a tua mão encostou na minha bochecha esquerda. Olhei para ti. Miravas-me fixamente, seriamente. Desfiz o sorriso embaraçoso que esboçava. A tua voz grave entoou nos meus ouvidos, aquecendo-me ainda mais:
- És linda.
Encostei o meu nariz ao teu e fechei os olhos. Ao tocar os teus lábios, envolveste-me com força e puseste-me em cima de ti. Senti tudo como se fosse novo, como se nunca te tivesse beijado antes. E, naquele calor único, soube que aquilo que nos unia era mais forte do que o poder de qualquer assinatura ou aliança.
quinta-feira, 29 de dezembro de 2011
delicadas harpas que não te consigo despir
Vejo-te aí, a toda essa (excessiva) distância de mim. Rodopias essas tuas serpentes enroladas imprecisamente, fazendo-as expelir esse veneno a que chamam perfume. Se de veneno não se tratasse, não me terias escravo da tua miragem. Enfeitiçados, os meus olhos perdem-se ao seguir os movimentos desses folhos que esvoaçam pelo ar, como pássaros brancos floridos.
Tu, musa sobrehumana, enches o ar de magia e rejuvenesces cada pedaço de chão por ti tocado, qual lisonjeio. A teu redor, tens todo um mundo submisso, sem que precises de fazer um mínimo esforço que seja. Para tal, precisas apenas de não forçar nada, nada desejar, e encarregar o teu corpo que, por natureza, difunda o branco suave que o interior da tua alma contém. A cor que cada porção de ar adquire transforma-te em anjo, com delicadas curvas sobre as quais os canudos do teu cabelo se deitam e eu me deleito. Cada linha do teu corpo é uma auréola da tua subtileza e me convida a apreciar a renda que as sombras desenham em ti.
Carteiro do teu aroma, percorro cada duna tua, cada delicado espaço de pele que me exibes timidamente. Timidamente, sinto a aspereza da ponta dos meus dedos tocarem as delicadas harpas da tua pele. E é com a mesma timidez de te sentir em mim, próxima do meu corpo, que a capa que não te consigo despir não se mostra indiferente ao desejo de amar que os meus lábios suavemente emanam sobre ti. Juntos, compusemos as mais esbeltas melodias -- as mais puras e as mais fervorosas. Eu, contudo, limito-me a deixar-me levar pelas sugestões da tua dócil riqueza humana. Todo o conteúdo das maravilhas que cantamos emanam da tua profana afabilidade, do calor que tu, deusa, expeles de ti.
Vem até mim, morena. Faz de mim teu seguidor e deixa que eu me satisfaça nos requintes do teu ser.
Tu, musa sobrehumana, enches o ar de magia e rejuvenesces cada pedaço de chão por ti tocado, qual lisonjeio. A teu redor, tens todo um mundo submisso, sem que precises de fazer um mínimo esforço que seja. Para tal, precisas apenas de não forçar nada, nada desejar, e encarregar o teu corpo que, por natureza, difunda o branco suave que o interior da tua alma contém. A cor que cada porção de ar adquire transforma-te em anjo, com delicadas curvas sobre as quais os canudos do teu cabelo se deitam e eu me deleito. Cada linha do teu corpo é uma auréola da tua subtileza e me convida a apreciar a renda que as sombras desenham em ti.
Carteiro do teu aroma, percorro cada duna tua, cada delicado espaço de pele que me exibes timidamente. Timidamente, sinto a aspereza da ponta dos meus dedos tocarem as delicadas harpas da tua pele. E é com a mesma timidez de te sentir em mim, próxima do meu corpo, que a capa que não te consigo despir não se mostra indiferente ao desejo de amar que os meus lábios suavemente emanam sobre ti. Juntos, compusemos as mais esbeltas melodias -- as mais puras e as mais fervorosas. Eu, contudo, limito-me a deixar-me levar pelas sugestões da tua dócil riqueza humana. Todo o conteúdo das maravilhas que cantamos emanam da tua profana afabilidade, do calor que tu, deusa, expeles de ti.
Vem até mim, morena. Faz de mim teu seguidor e deixa que eu me satisfaça nos requintes do teu ser.
sexta-feira, 25 de novembro de 2011
Os amantes de Valdaro
Observem bem a imagem.
Mas sabem que é amor.
![]() |
Conseguem distinguir a raça? Não.
Conseguem distinguir o sexo? Não.
Conseguem distinguir o dinheiro? Não.
Mas sabem que é amor.
Acho que não preciso de dizer mais nada.
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sexta-feira, 4 de novembro de 2011
sei sem saber
Amo-te como o rio que não corre deliberadamente pelas colinas.
Amo-te sem te sentir, sem te conhecer.
Sei-te, não te sabendo, sem padrão ou vontade expressada.
Expresso-me não o sabendo.
Sabendo que te amo, amo-te sem o saber.
E deixo que o rio corra pelas colinas, sem haver movimento na minha ação.
Ou como este vento que fica retido em mim, sem vez alguma parar.
E quero-te, em corpo pensado. Em pensamento que a tua presença não me traz. Presença física, definem os propositadamente padrões estipulados, que alterna com esta presença ausente. Presença que não consigo saber, nem escolher. Porque nem o desejo, não sabendo qual a melhor.
Porque o rio corre, mas não deliberadamente. Porque não o precisa.
terça-feira, 25 de outubro de 2011
cristalina sedução
Os seus pés caminhavam na diagonal, esperançosos de encontrar o motivo pelo qual o seu coração se atirava desmesuradamente contra a sua caixa torácica, num ritmo cada vez mais difícil de medir e impossível controlar. O suor das suas mãos era frio e transparecia a ansiedade que fazia o seu estômago contorcer-se e vibrar, qual arrepio profundo.
Estagnada no alto daquele lance de escadaria, ela sentiu o tempo parar por momentos, apenas para ela, num espaço que mais ninguém conseguiria presenciar, por mais que para tal se esforçasse: essa dinâmica metafísica que a fazia não sentir corpo e sentir só alma, uma alma de repente dormente após o alcance da sua frequência cardíaca máxima; esse segmento de reta que se debruçava dos seus olhos até a todo aquele corpo igualmente imobilizado, paralisado pelo aparecimento da surpresa por que esperara longos anos. Nessa pista que apenas nela, única corredora, ganhava formato, fez o seu corpo escorregar mais calmamente até à meta, onde largou o fôlego de uma vida esperançosa daquele repouso.
Despindo-se de tudo o que poderia colocar-se entre si e o seu prémio de consolação, pousou, qual pássaro fatigado, no calor do seio fraterno, cujo bafo se fazia sentir humidamente nos seus lábios. E, finalmente envolta pelos braços de um condutor que a protegia contra si carinhosamente, ela deixou a sua alma dançar ao ritmo da melodia que ambos compunham, demoradamente, irresistivelmente.
A adoção do adagio enquanto ritmo mais expressivo da paz intensa que dos lábios humedecidos emanava, nada pacífico restando para as mãos, submersas à força a que não haviam resistido, revelou-se incapaz de saciar a reposição dos átomos que desempenhavam a função única de fazer cumprir as ordens que a mente havia deliberado, antes de adormecer em inconsciência aprazível. E foi assim que se deixaram subtilmente deslizar em larghissimo, coordenados inequivocamente em sintonia mística de origem desconhecida.
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quinta-feira, 13 de outubro de 2011
"Mais do que maquinaria, nós precisamos de humanidade."
-- O ditador de Tomania, o conquistador de Osterlich, o futuro imperador do mundo!
-- O senhor tem de falar.
-- Eu não consigo!
-- O senhor tem. É a nossa única esperança.
-- Perdoem-me, mas eu não quero ser um imperador. Esse não é o meu ofício.
«Eu não quero governar ou conquistar quem quer que seja. Eu gostaria de ajudar todos se possível: judeus, não judeus, homens negros e brancos. Todos nós queremos ajudar-nos uns aos outros. O ser humano é assim: nós queremos viver da felicidade dos outros, não da angústia dos outros. Não nos queremos odiar e desprezar uns aos outros.
«Neste mundo há espaço para todos e a boa Terra é rica e pode alimentar todas as pessoas. O estilo de vida poderia ser livre e lindo, mas nós perdemo-nos no caminho. A ganância envenenou as almas dos homens, construiu no mundo uma barreira de ódio, guiou-nos para o caminho da angústia e do derramamento de sangue.
«Desenvolvemos a velocidade, mas prendemo-nos a nós próprios. A maquinaria que nos dá abundância deixou-nos na necessidade. O nosso conhecimento tornou-nos cínicos, a nossa inteligência tornou-nos duros e cruéis. Pensamos demasiado e sentimos muito pouco. Mais do que maquinaria, nós precisamos de humanidade. Mais do que inteligência, nós precisamos de carinho e bondade. Sem essas qualidades a vida será violenta e tudo será perdido.
«O avião e a rádio aproximou-nos, mas a natureza destas invenções grita em desespero pela bondade do Homem -- grita pela irmandade universal e a unidade de todos nós -- mesmo agora, que a minha voz está a alcançar milhões no mundo, milhões de homens desesperados, mulheres e crianças pequenas, vítimas de um sistema que faz os homens torturar e aprisionar pessoas inocentes.
«Para aqueles que me conseguem ouvir, eu digo: não desesperem! A miséria que está entre nós é a passagem da ganância, a amargura dos homens que receiam a forma do progresso humano. O ódio dos homens passará e os ditadores morrerão -- e o poder que eles retiraram às pessoas voltará para as pessoas -- e enquanto os homens morrem, a liberdade nunca perecerá.
«Soldados, não dêem as vossas almas a brutos: homens que vos desprezam e vos escravizam; que regem as vossas vidas e vos dizem o que fazer, o que pensar, o que sentir; que vos exercitam, vos alimentam mal, vos tratam como rebanho, vos usam como forragem de canhão! Não se entreguem a estes homens artificiais -- homens-máquina, com mentes-máquina e corações-máquina! Vocês não são máquinas! Vocês não são rebanho! Vocês são homens! Vocês têm o amor da humanidade nos vossos corações. Vocês não odeiam: só os que não são amados odeiam -- os não amados e os artificiais. Soldados, não lutem pela escravidão: lutem pela liberdade!
«No décimo sétimo capítulo de S. Lucas está escrito: o reino de Deus está dentro dos homens -- não de um homem, nem de um grupo de homens, mas em todos os homens: vocês! Vocês, o povo, têm o poder -- o poder de criar máquinas, o poder de criar felicidade! Vocês, o povo, têm o poder de fazer esta vida livre e linda, de fazer desta vida uma aventura maravilhosa! Então, em nome da democracia, vamos usar esse poder, vamos todos unir-nos! Vamos lutar por um novo mundo -- um mundo decente, que vai dar aos homens uma oportunidade de trabalhar, que vai dar aos jovens um futuro e aos idosos uma segurança! Prometendo estas coisas, os brutos alcançaram o poder, mas eles mentiram: eles nunca cumpriram a sua promessa, eles nunca o farão! Os ditadores libertam-se a si próprios, mas escravizam as pessoas! Agora vamos lutar por alcançar essa promessa, vamos lutar para libertar o mundo, para acabar com as barreiras nacionais, para acabar com a ganância, com o ódio e a intolerância! Vamos lutar por um mundo de razão -- um mundo onde a ciência e o progresso nos levarão à felicidade de todos!
«Soldados, em nome da democracia, vamos todos unir-nos!
O Grande Ditador, Charles Chaplin, 1940
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quarta-feira, 12 de outubro de 2011
28. Carta à pessoa que mudou a tua vida
Em seguimento de masoquismo ou culto próprio?.
Por vários motivos, que não competem a mais ninguém saber para além de ti.
Parabéns, meu amor, e que contes muitos mais, a meu lado e tão ou mais felizes como no tempo que temos atravessado.
Por vários motivos, que não competem a mais ninguém saber para além de ti.
Parabéns, meu amor, e que contes muitos mais, a meu lado e tão ou mais felizes como no tempo que temos atravessado.
«Words get trapped in my mind.
Sorry, I do not take the time to feel the way I do,
Because the first day you came into my life
My time ticks around you;
But then I need your voice,
As a key, to unlock all
The love that is trapped in me,
So, tell me when it is time
To say I love you.
All I want is you to understand
That when I take your hand
Is because I want to.
We are all born in a world of doubt,
But there is no doubt,
I figured out
I love you.
And I feel lonely for
All the losers that will never take the time to say
What was really on their mind. Instead,
They just hide away.
Yet, they will never have
Someone like you to guide them
And help along the way
Or tell them when it is time
To say I love you.
So, tell me when it is time
To say I love you.»
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quinta-feira, 6 de outubro de 2011
sexta-feira, 30 de setembro de 2011
bem paradoxal
Pele suave, aspereza delicada.
Dos seus lábios me vejo enamorada.
Encontro-me então densamente sentida
Por firmeza de amor sedento de vida.
O sussurro do afeto marcado
Pela proteção leal
Entranha-se, assim, preocupado
Com o paradoxo do mal.
O segredo da cautela
Enraizado pelo risco
Desperta para a sentinela
A inconsciência a que não resisto.
As asas, porém, com o anjo
Não partem. Não.
Elas limparam de mim
Toda a preocupação;
E assim me deixo
Pelo vento levar,
Em deliberado eixo,
Para no meu rumo voar.
Dos seus lábios me vejo enamorada.
Encontro-me então densamente sentida
Por firmeza de amor sedento de vida.
O sussurro do afeto marcado
Pela proteção leal
Entranha-se, assim, preocupado
Com o paradoxo do mal.
O segredo da cautela
Enraizado pelo risco
Desperta para a sentinela
A inconsciência a que não resisto.
As asas, porém, com o anjo
Não partem. Não.
Elas limparam de mim
Toda a preocupação;
E assim me deixo
Pelo vento levar,
Em deliberado eixo,
Para no meu rumo voar.
sábado, 3 de setembro de 2011
quinta-feira, 1 de setembro de 2011
calor húmido
As harpas pararam de tocar, os anjos silenciaram-se e os pássaros recolheram-se para os seus abrigos, protegendo os seus filhos.
É noite e chove.
Em vez do habitual calor estival que seca quase excessivamente as fontes de vida, ouve-se apenas o tilintar de pérolas oxigenadas. As luzes brilham cada vez menos dentro das casas, ansiosas por uma pausa demorada.
Este é o único estado de tempo que quero que me reflicta, pelo menos em estado de humor: quente e húmido. Não quero estar excessivamente quente, ardentemente louca; não: não quero esbracejar-me em aflição por um galho mais fresco, para, em breve, partir. Também não quero regressar à gélida frieza que provoca o desejo de hibernar, esconder, refugiar - em solidão. Ambas as situações são pretéritos que eu quero manter perfeitos, esféricos - irrevogáveis.
Quero permanecer na delicadeza da humidade, na presença do calor. E, para não me abafar, quero não me esconder. Quero alongar esta doce melancolia e, ao observar o céu lá fora, sentir o calor dos teus braços envolverem-me o tronco, do teu peito contra mim e a humidade dos teus lábios nos meus; e saber que me abrigo em ti, naquele íntimo, por decisão nossa, sabendo, ao mesmo tempo, que poderemos depois esbracejar-nos ao sabor do vento, sem pressas nem contradições, olhando para um mundo que nos é exterior de cima.
E, sobretudo, ser impossível de conjugar este tempo sem ser num presente simultaneamente simples e contínuo, porque não só se repete como é sempre sem fim previsível, sem vez alguma ser algo meramente do futuro.
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sábado, 27 de agosto de 2011
o dia em que o mundo não me viu
Conteúdo para Adultos
Cortei com fervor as paredes que te iluminavam. Chorei cada sombra que me esmagava na sua queda.
Queda fiquei. Ficando te amei. Te amando odiei. Odiando chorei. Chorando gritei. Gritando rasguei. Cortei. Roubei. Matei.
As minhas unhas finquei nesse tecido abusador e com a força dos meus braços fiz as minhas mãos arrancarem todo o pudor de ti, findando a tua dignidade e o meu sofrimento.
Os meus pulmões fizeram o meu tórax inchar e recolher-se, num compasso sexual.
E, naquela moldura magicamente cantante, eu amei-te como ninguém alguma vez o tinha feito.
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quarta-feira, 24 de agosto de 2011
Bon Jovi: What Do You Got?
«Everybody wants something,
Just a little more.
We are making a living
But what are we living for?
A rich man or a poor man,
A pawn or a king:
You can live on the street,
You can rule the whole world,
But you do not mean one damn thing.
What do you got, if you ain't got love?
Whatever you got, it just ain't enough.
You are walking the road, but you are going nowhere.
You are trying to find your way home, but there is no one there.
Who do you hold
In the dark of night?
You want to give up,
But it is worth the fight:
You have all the things that you have been dreaming of.
If you ain't got someone,
You're afraid to lose.
Everybody needs just one,
Someone,
To tell them the truth.
Maybe I am a dreamer,
But I still believe:
I believe in hope,
I believe that change
Can get us off of our knees. (...)
If you ain't got love, it is all just keeping score.
If you ain't got love, what the hell we doing it for?
I do not want to have to talk about it.
How many songs have I got to sing about it?
How long are you going to live without it?
Why does some somewhere have to doubt it?
Someday you will figure it out. (...)»
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domingo, 21 de agosto de 2011
horas extraordinárias
Quando chegares a casa avisa-me, dizia o mostrador do seu telemóvel.
Ainda pensou em telefonar a avisar que tinha saído agora do trabalho e que estava a caminho de casa. Lembrou-se, no entanto, de ter ficado horas extraordinárias encafuada naquele laboratório e de ter perdido a noção do tempo.
Quatro e meia da noite, viu. Cinco horas após ter recebido aquela mensagem.
- Eu não tenho NADA a ver com isso! Percebes? Nada! Eu não quero saber disso! Estou-me nas tintas!
Ele já devia dormir e seria rude da sua parte acordá-lo para resolverem o que o seu mau humor havia causado. Agora, vinham-lhe à memória flashes da sua indelicadeza para com alguém que a amava e respeitava.
Sempre quis a seu lado alguém que a respeitasse e a amasse pela pessoa que era, ao invés do que era hábito acontecer, e agora que tinha alguém assim não lhe dava o devido valor, ou pelo menos assim achava. Parecia-lhe aquele homem merecer todo o carinho do mundo, mas que fazia ela?
- Olha, eu agora não posso falar, está bem? Estou a conduzir e não me posso enervar, para além de que não devo chegar ao trabalho neste estado. Nós depois falamos. Adeus.
Queria correr até ele, abraçá-lo, beijá-lo, passar veementemente uma borracha naquelas horas que se haviam passado antes de sair de casa. Dizer-lhe que o amava e que o queria a seu lado para sempre, porque, na verdade, queria-o mesmo. Perder-se sofregamente nos seus braços e beijá-lo como pela primeira vez. Entregar-se inteiramente ao corpo que detinha a mente que mais estimava. Tudo porque, de facto, sem saber se estavam bem, tudo à sua volta lhe parecia insignificante e melancólico: vazio e, simultaneamente, excessivamente preenchido.
Agia como se ele lhe fosse seguro e insensível. Como se pudesse esmurrá-lo verbalmente, que nenhuma das gotas de chuva que caíam nos vidros do carro fariam latejar o laço que o prendia a ela, qual âncora lançada ao mar. As âncoras, porém, também se içam e recolhem ao navio, quando há muita força de vontade para tal.
Fui uma bruta, pensou, enquanto libertava com brusquidão a mão do telemóvel, para apoiar a cabeça. No fundo, havia feito com ele o que os outros haviam anteriormente feito com ela, num egocentrismo egoísta e exagerado. Sabia que ele merecia muito mais do que aquilo e que ela era capaz de lho dar. Urgentemente, precisava de lhe pedir desculpa, mas agora já era tarde.
Desviou o caminho que a levava até casa. Com as chaves que ele lhe havia concedido, abriu a porta da casa dele o mais silenciosamente possível, de modo a que, na manhã seguinte, quando ele acordasse e visse que ela não lhe tinha telefonado, reparasse no corpo que vestia uma camisola sua e dormia a seu lado, quiçá por se mover e o sentir ou talvez por lhe enviar uma mensagem a perguntar Então? e ouvisse de imediato o destinatário a recebê-la, ali mesmo, no seu próprio quarto, compreendendo que, afinal, era apenas uma mulher arrependida e, no fundo, verdadeiramente inofensiva.
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