domingo, 4 de março de 2012

Homme Fatal

Conteúdo para Adultos


     Sentada de lado no cadeirão escarlate, via as minhas pernas despidas, apoiadas no braço direito da poltrona, mudarem de cor, conforme o crepitar das labaredas. O amarelo avançava progressivamente em relação à minha direita, debruçando-se por cima de mim para me abraçar a cintura. Não o conseguindo, um vestígio de sombra ficava desde o meu nariz até à biqueira das minhas sabrinas cor de cinza. Na transição entre o sonho e o sucesso, estava aberto no colo da minha saia cinzenta pregada um espesso volume, onde as rivalidades entre lobisomens e vampiros me eram explicadas. O confortante calor, que, naquela noite de fevereiro, era expelido da lareira no meu lado esquerdo, permitia que eu tivesse apenas a camisa branca vestida, donde pendia a minha gravata vermelha e amarela, e as mangas arregaçadas.
     Àquela hora, não costumavam estar muitas pessoas na Sala Comum. Atrás de mim, deveriam estar umas quatro ou cinco raparigas histéricas e um pouco invejosas. Pelo menos assim me pareciam, quando costumavam ver o garanhão desprezá-las para me dar a atenção que ninguém supostamente conseguiria despertar nele. Eu ouvia-as comentar as fofocas mais pindéricas que a imprensa poderia vender e as bugigangas mais dispensáveis que poderiam ser comercializadas. Mais adiante, estavam dois rapazes e uma rapariga de volta dos papéis, quiçá a escrever um relatório para a manhã seguinte ou apenas a fazerem o tempo livre render. Digamos, um deles não deveria certamente estar ali pelo segundo motivo, talvez até nem tanto pelo primeiro, mas mais para não se sentir só. Nunca tinha percebido como uma pessoa tão dependente dos outros pudesse ser aceite como uma de nós, embora compreendesse que talvez apenas eu visse algo de errado naquele rapaz. Mais imparcialmente, era a minha tendenciosidade contra a ingenuidade deles. Como tal, e por questões de respeito, eu limitava-me a não lhe dar muita atenção.
     Sentia-me preguiçosa em todo aquele meio agradável e estiquei-me para trás. Deixei a cabeça e os braços penderem no sofá e fiquei a ver o teto com carpete escarlate e o chão com candeeiros. O meu corpo foi perdendo força e os meus músculos relaxaram, em verdadeira paz física. Fechei os olhos e lembrei-me do cheiro do negro cabelo dele. Ah, como gostava que me envolvesse com aqueles seus fortes braços e preenchesse com os seus lábios rosados e carnudos o espaço entre os meus! Como gostava desse seu jeitinho mal intencionado e de como colocava o seu braço à volta dos meus ombros e me aquecia as bochechas com beijinhos, apertando-me com força! E como gostava de não precisar que me admitisse nada...
     -- Olá, estudiosa -- uma voz masculina e grave me disse em tom alegre e malandro. Abri os olhos e paralisei por momentos, como que ainda a processar a informação. Levantei a cabeça e, para minha surpresa, ali estava ele, debruçado sobre as costas do cadeirão, com um ligeiro sorriso nos lábios e os cabelos que nem cortinados ondulados, caídos.
     -- Estás aí há muito tempo?
     Abriu o sorriso por completo e, no mesmo ar sedutor, levantou-se do sofá e contornou-o. Parou encostado às minhas pernas, quase a meu lado, e vi o seu corpo abaixar-se e avançar em direção a mim, enquanto senti o sangue correr mais depressa e o peito inchar por causa aquele ar galã que ele tinha. Não me lembro de pensar mais nada, nem de reagir, quando pousou uma mão de cada lado do meu pescoço e avançou a sua cara em direção à minha:
     -- Há suficiente para perceber que essa camisa te fica muito bem.

2 comentários:

Olinda Gil disse...

A meio pensei que se iria tornar num conto fantástico. Está muito bom!

Anónimo disse...

Olinda P. Gil ©: Na verdade, é baseado numa saga fantástica, embora não seja na fantasia que incida.
Obrigada! :D