Eu tinha chegado, como é habitual, cedo à escola. Recordo-me de ver alguns dos meus colegas sentados no chão, à porta da sala 32. Estava na minha actual escola e a manhã custava a aparecer. Estava escuro, pouco se conseguia ver para fora das janelas. Julgo ser primeiro dia de aulas de algum período, porém a imagem não me é clara. Sei que estava lá pouca gente e dificilmente o pavilhão do secundário encheu, havendo sempre animação nas notícias que há para contar. A Catarina, de cabelos encaracolados até aos ombros, com uma camisola azul escura, estava sentada no chão, de pernas à chinês, de costas para o resto da escola, em frente à varanda do secundário. A Catarina é uma boa moça, dotada de alguma maturidade, de sentimentos profundos e nobres, de um senso de justiça que a revolta constantemente. Ela é minha amiga e admira-me tanto, gosta tanto de mim, que já antes não se conteu numa aula - ela, que é das alunas mais sossegadas! - e desatou a discutir para me defender. Eu não estive lá para ver, mas confio nas palavras dela e de mais gente que lá esteve a ver, escandalizados com tal revelação. Eu adoro-a. Ela chega sempre depois de mim, assim como toda aquela gente que lá estava, conversando, mas por alguma estranha razão hoje estavam uns dez ali, antes de mim. Isto nunca acontece: só aconteceu uma vez, quando a carrinha teve problemas técnicos e cheguei apenas a cinco minutos da entrada. Rodeada de papelada, estava acompanhada da sua professora Cristina Braga, recebendo explicações dalguma matéria. A Catarina é muito aplicada, ela sabe que precisa de mais estudo e mais esforço do que eu, as suas dificuldades são sempre gigantescas em comparação com as minhas. Mas eu acredito que ela vá passar. Foi curioso, porque a professora estava também, de pernas cruzadas à chinês, sentada no chão, e aquela professora costuma ser mais requintada do que isso. Ela é professora de Português e partilha as turmas de secundário com a minha professora de Português, Susana Neves, não me dando aulas a mim. É baixa, tem a pele com um tom mais bronzeado ou moreno, não o sei dizer, tem o cabelo liso e curto, castanho-violino, talvez, usa óculos, costuma falar com ar intelectual e tem uma reputação confusa: uns dizem que ela é uma bruxa, outros dizem que a adoram, mas todos concordam em ela ser bastante exigente, apesar de explicar bem; eu não o sei dizer, lembro-me de ouvi-la gritar por vezes na sala ao lado e só tive uma aula de substituição com ela, que passámos a falar sobre a escola, sobre leitura e outros temas menos formais - foi agradável, até, mas não foi suficiente para perceber por mim mesma que tipo de professora é, se é que existe algum tipo para si. Eu paralisei a olhar para elas e ambas pararam de estudar para olhar para mim, sorridentes e amáveis. Não sei em que estava a pensar, lembro-me apenas de tocar em cada dedo da minha mão, a Catarina levantar-se e vir ter comigo, carinhosa, e perguntar-me:
- Então, Cármen, como estás? Que estavas a fazer? Por que estás paralisada aí assim a olhar-nos?
Não sabia o que responder. Nesta altura também a professora se levantava e sorridente ajudava a arrumar as coisas da Catarina.
- Estava a fazer contas de cabeça.
- De cabeça?! Credo, sem calculadora é chato. - comentou ela, mostrando a sua preguiça íntima.
- Por acaso até não é, quando não existiam calculadoras ninguém se queixava.
- Ah, então a menina também é desse grupo? - acho conveniente a professora intervir.
- Grupo, que grupo?
A professora levantara-se agora e dirigia-se a mim, com um ar interessado em ouvir-me, menos sorridente e mais natural.
- Então... grupo de pessoas que preferem a mente à calculadora, assim!
- Eu não estou habituada a cálculos mentais, mas apelo à libertação independente da tecnologia, que apenas veio a degradar o que de melhor temos.
- A menina tem que idade?
- Eu? Quinze anos.
- Ah, sim, é a menina que vai fazer anos agora em Abril, já me recordo.
Fiquei assustada: como é que ela podia lançar palpites sobre o meu aniversário? Para que é que o fazia? Estava só a tentar criar uma imagem de pessoa que se interessa por mim e quer mostrar-se conhecedora?
- Eu, em Abril?! Não...
- Ah, esqueça, já me lembro, 4 de Maio, não é?
- Não, professora, 1 de Junho.
Um rapaz de 16 (ou 17?) anos da minha turma levantou-se do chão central do piso de baixo e num passo saltou em direcção à minha turma, como se pudesse voar diagonalmente do piso de baixo para o de cima. Ele, que não deixava crescer o cabelo e rapava-o constantemente, tinha agora tranças.
Estou na minha escola antiga, no balneário de Educação Física, e apresso-me a vestir-me, pois já estava atrasada para Filosofia. A Joana pede-me uma gilete e, depois de lha emprestar, depila os pêlos dos braços. Tenho o cabelo comprido até ao rabo, uma camisola em forma de vestido vermelha, com flores pretas, tenho umas calças de ganga azuis escuras e uns ténis vermelhos e brancos de salto. De repente, já passava quarenta e cinco minutos da entrada para a aula! Entre nós está a irmã do Rui, com cabelos longos e pretos, cuidados e ondulados; veste um vestido de cerimónia branco folhado, parecendo uma boneca. Não sei o que faz ali, com apenas 10 anos. Antigos colegas meus aproximam-se da entrada e nós pedimos mais tempo. Quando saio, sou a última e corro, fazendo a depilação pelo caminho, subindo a escola em direcção ao pavilhão de aulas; mas a porta está fechada e há grupos descontentes de alunos irrequietos batendo na porta. Afasto-me de toda aquela confusão e pergunto aos meus colegas (mas afinal em que turma estou?) o que se passa ali, porque ninguém entra, se estávamos em aula. Triste e zangada, a Ângela diz-me sei lá.
Estou na sala, as mesas estão todas separadas, como em dia de teste, e sei que o professor Simas deverá estar chateado connosco. Pergunto-me o que já deveriam os outros ter dado de matéria nova que eu perdi e, como se nada houvesse sucedido, os meus colegas menos responsáveis pedem metade da primeira aula para estudar MACS e o professor, irónico, exclama:
- Hoje a primeira hora é de MACS. Vamos fazer dois grupos de duas pessoas: eu sou um banco e mais alguém que fique comigo. - aponta a um aluno e pergunta - Ficas tu comigo? Quem mais é o outro banco?
- Eu e o Pacheco, stôr! - candidata-se a Filipa.
- Muito bem, então é assim: cada folha que se passa para a frente é mais dois valores de capital positivo e cada folha que se passa para trás o contrário. Entendido, pessoal?
Recebo uma folha da Helena, que está à minha frente, com um ar de disfarce da tristeza e isso preocupou-me. Ela não queria tentar resolver o problema? Ela vira-se para a frente e espera que a tarefa mude. Era com ela. Mas como é que aquilo se resolvia mesmo? Leio a folha e ouço um colega meu atrás de mim a ler baixinho para ele. Desejava que se calasse, para eu me poder concentrar. Vejo crianças desenhadas no papel, umas a saltar, outras quietas, outras brincam. Aquele exercício parecia uma folha daquelas que os professores nos dão para fazer na primária. Mas o que é que aquilo tinha de filosófico e conveniente para a aula? Não importa, isso logo o professor dirá. Desvendava as frases através das imagens: meninas brincam, pulam, saltam e caem. É dia 16 e, por esta hora, o menino pato toma banho.
Estranho? Por alguma razão, foi o meu sonho esta noite. Note-se que não é um texto negativista típico da minha escrita, mas assustou-me, devido à mensagem que quererá dizer e, uma vez mais, à repetição perseguidora do número 16.
2 comentários:
De nada, tinha que o fazer x)
Eu estava aqui a ler o teu texto, e a pensar que estranho, e não estava a entender o logico, depois no fundo acabei por ler, que foi o teu sonho, agora entendi...também me apercebi da presença do numero 16, talvez seja porque andas a pensar em algo que tenha a ver com isso, ou então durante o dia ouve lago que te influenciou, ou simplesmente estas com medo desse numero, não sei...mas o teu sonho foi interessante, os meus são sempre terriveis =)
eu por acaso gosto desse tipo de escrita..eu gosto de não entender e voltar a tras até entender aquilo, e as vezes nem entendo, simplesmente apartir de aquilo penso talvez em tantas outras coisas, mas o livro que estou a ler agora não tem nada a ver com isso...sabes podes achar estranho mas eu sem ler, acho que consigo aumentar a capacidade de escrita, devido ao tanto que reflito, ou penso...
então não és as unica, mas eu dou um certo valor aos sonhos, mas os meus sonhos costumam ser tudo que la no fundo desejo ou penso, ou então que não quero acontece...e simplesmente junta-se tudo, eu fico assim um bocado parnoica
agora isso do 16 é estranho, passou-se algo nessa data =?
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