Em seguimento de
masoquismo ou culto próprio?.
Gostava que lesses cada palavra que escrevo com a mesma atenção com que as escolho. Não pretendo lembrar-te do sofrimento que me causaste nem reviver o sofrimento que me causei, ao te enganar. Nenhum de nós tem cadastro limpo nesta história, mas não é reanimá-lo que pretendo. Quero, através desta carta, fazer aquilo que há algum tempo planeava fazer diretamente, fisicamente. Mas, como poderás induzir, a minha realidade mantém-se semelhante e fazê-lo é-me impossível. Não obstante, é muito importante para mim que tenhas noção de todas as coisas que te quero dizer, porque também te ajudarão, creio, a ultrapassar algum do sofrimento por que tens passado, assim como a alguns dos que te rodeiam, nomeadamente a tua atual namorada. Esta carta permitir-nos-á limpar os vestígios do passado e consolidar um problema que foi deixado aberto. Por estes motivos, reforço que gostava que encarasses isto com muita seriedade, que me lesses com muita atenção e que, ainda, mostrasses isto à tua Maria. Não me importa se vocês mantém a relação ou não, mas faço questão de que também ela leia isto.
A pessoa com quem namoraste durante menos de um mês tudo o fez por ilusão e sem amor. Gostava de ti, ou pelo menos da pessoa que achava que eras, e por isso nunca teve coragem de te fazer parar. Foi um erro, admito-o. Não adianta mais arrepender-me por isso ou sentir-me suja pelo mal que fiz. Olhar para trás só pode ser positivo enquanto é possível aprender com o passado. Juntar emoções, quer negativas quer positivas, a essa reflexão apenas nos retém nas memórias e nos impede de progredir. E quando essas emoções são negativas, para além de nos reterem, causam-nos sofrimento, que é sempre desnecessário, e perdas de auto-estima. E, como te deves recordar, eu não sou de permitir que isso aconteça.
No entanto, também sei que tudo o que fizeste foi sem amor. Por ilusão, não sei - só tu o poderás dizer. Mas sem amor sim, porque facilmente te entregaste e rapidamente deixei de te interessar. Mas acerca disso já nós conversámos e não adianta remexer nisso.
No entanto, nunca te menti quanto à pessoa que era nem nunca fingi uma personalidade que não a minha. A pessoa que tu achaste conhecer foi aquela que, de facto, conheceste e apenas um pouco menos daquela que hoje te escreve, tendo em conta que não só a minha coragem aumentou, como também a minha força, a minha determinação, o meu senso de justiça, a minha inteligência e a minha frontalidade o fizeram. Hoje sinto-me uma mulher. Há um ano, uma miúda a querer sê-lo.
Com isto, quero limpar o meu nome de todos os atos injuriosos que nos últimos meses te têm ameaçado, a ti e à Maria. Não sei como essa história se sucedeu ao certo, mas acredito que tenha a ver com alguém com um e-mail parecido com o meu que vos tenha insultado, amedrontado e, inclusivamente, ameaçado.
Bruno, eu seria incapaz disso.
Por mais mal que me fizesses, seria incapaz de te retribuir uma pequena porção que fosse de maldade ou de sequer de te desejar mal. Eu não sou vingativa nem consigo fazer mal deliberadamente. Prefiro ser a vítima do que a culpada e acarretar a dor a provocá-la nos outros.
Não adiantaria de nada tentar vingar-me. Cada acto é um fim em si e não pode ser substituído. Não é um meio para atingir algo, cada ato é único e julgável por si só. Ao fazer-te mal, eu não estaria a fazer justiça (vingando-me), porque a minha pessoa continuaria injustiçada: eu apenas estaria a cometer um outro ato malvado, nunca compensando o anterior. O anterior permaneceria lá à mesma. Acharmos que a vingança é possível não passa de uma ilusão. Fazer-te sofrer não iria apagar o meu sofrimento do passado.
Da mesma forma, de nada me adiantaria magoar a Maria, mas com um outro motivo acrescido: para além de não estar a justiçar os erros do passado (que esses permanecem onde estão, por serem um fim em si mesmos) e de estar a cometer maldade escusada, estaria a fazê-la ainda mais injustamente. A Maria não é responsável por qualquer dos nossos erros do passado. Ela não interferiu em nenhum deles, nem enquanto objeto nem enquanto sujeito. E, ainda que fosse objeto, não seria responsável, porque o ato não partiu de si. Ela simplesmente não interferiu em nada do que aconteceu entre nós. Não poderia vingar-me nela do que eu e tu fizemos, ainda que acreditasse na eficácia da vingança. Se poderia achar que ao magoá-la te magoaria a ti, vendo-me satisfeita, assim? Sou maior do que isso, Bruno. Achava que já te tinha convencido disso.
Surpreende-me, portanto, que tenhas acreditado que alguma vez eu fosse capaz de fazer o que vos têm feito, ou de sequer influenciar alguém a fazê-lo.
E, como se não bastassem estas provas racionais (que invalidam todo e qualquer ato semelhante ao que vos foi feito), há aquelas provas, que até me fazem rir, de que era impossível eu fazer fosse o que fosse. Eu, Bruno, não tenho meios para te contactar, nem para atingir a Maria - nem psicologicamente, nem fisicamente - da forma direta como vos têm feito e prometido.
Espero ter esclarecido este assunto e ter, como pretendia, limpado qualquer rastro de imaturidade que me tenha ficado agregado.
Está na altura de encarar as coisas com a maturidade necessária para ser tranquilamente feliz e seguir em frente.
Sê feliz, Bruno, sem que guardes remorsos da minha parte.